domingo, 1 de março de 2009

Entre Mundos



Todas as noites ela se deita à meia-noite. Nem um minuto antes... nem um minuto depois... Mergulha na doce calma acetinada dos lençóis e deixa-se adormecer placidamente.
Todas as noites ele espera pacientemente que ela adormeça. Quando ouve a sua respiração regular, de quem partiu para o mundo dos sonhos, entra no quarto, calçado de nuvem, e sem um som, aproxima-se da cama e senta-se ao seu lado. Contempla o rosto dela que quase sempre dorme a sorrir... e olhar aquele sorriso, fá-lo sorrir também.
Com as pontas dos dedos percorre ao de leve as suas faces e as madeixas soltas de cabelo que se espalhavam rebeldemente pela almofada.
Debruça-se sobre o seu rosto e sussurra-lhe doces palavras ao ouvido. Ela sorri ao ouvir essas palavras, que a ela lhe chegam em forma de sonho.
Ele levanta-se num impulso quase religioso e percorre todo o quarto... com gestos de quem já o fez mil vezes e de quem o vai fazer mil vezes mais.
Toca nas suas roupas penduradas no armário... abre cada uma das gavetas e acaricia as roupas dobradas. Dirige-se à cómoda... contempla os brincos favoritos dela, as pulseiras... os anéis... Pega no pequeno frasco de perfume lilás semi vazio. Sente o frio do vidro nas suas mãos e inspira um pouco daquela essência adocicada que o faz desejar beijá-la mais do que nunca...
Olha de relance para a cama, a respiração regular dela faz com que o peito levante os lençóis para cima e para baixo, quase imperceptivelmente.
A noite passa devagar, sem pressas, como se o próprio tempo tivesse adormecido também.
Como todas as noites ele permanece ao lado dela, tocando-lhe ocasionalmente na mão adormecida ou na face, percorrendo todo o ângulo e terminando na linha do pescoço. Deseja ardentemente que aquela noite não acabe nunca e que aquele momento permaneça para sempre congelado no tempo.
A madrugada, que aos olhos dele é algo de aterrador, acaba inevitavelmente por chegar...
Ele inclina-se resignado e encosta os seus lábios suavemente aos dela. "Até logo à noite", sussurra em jeito de despedida. Ela sorri e aconchega-se mais um pouco.
Quando o primeiro raio de sol penetra no quarto... já ele se foi embora... silencioso... calçado de nuvem.

4 comentários:

Karlytus disse...

HUm.. estou surpreendido com tanta sensibilidade e romantismo.. n te via assim.. e tudo por causa das capas.. nao, nao sao as das tuas botas.. ;)

adorei este texto.. lindo..

Um beijinho azul bem leve.. :)

Brown Eyes disse...

Ginger hoje lembrei-me que ainda não tinha lido este teu blog todo. Claro que será a minha tarefa nos próximos tempos. Imagina como sou distraída.
Quanto ao "Entre Mundos" só tenho pena que histórias destas estejam restritas apenas a nós, os bloguistas. Esta é maravilhosa. Adorei a ideia do amor entre mundos. BJS

Starrydots disse...

Adorei. Os teus textos são sempre fantásticos.

Johnny disse...

Está muito bom e com aquela beleza simples e linear que nos leva calmamente pela leitura vertical do texto sem nos dar hipótese para pensarmos se há repetições 8há ali uma), enganos ou erros.